terça-feira, 18 de novembro de 2008

Alteridade (IV) - Alteridade Feminina

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Alteridade Feminina

Discutir a noção de individuo e a alteridade, como pré-supostos da relação necessária existente entre as pessoas, pode ser um ponto de partida fundamental para tematizar a chamada alteridade feminina.

É fato que homens e mulheres têm características peculiares que vão além da sexualidade e da anatomia. Normalmente essas diferenças são abordadas pressupondo uma complementaridade entre macho e fêmea, o que comprometeria uma noção de indivíduo. Isso não vem ao caso por enquanto.

Na tradição filosófica, enquanto seres, indivíduos, sujeitos, pessoas e etc., os dois sexos não são diferenciados. É apenas com a noção de identidade de gênero que o masculino e o feminino são colocados separadamente entre parênteses e pensados como diferentes, do ponto de vista identitário e não apenas biológico, como é apontado tradicionalmente.

Muitas vezes já me perguntei por que na história da filosofia não encontramos filósofas. Encontro as respostas na própria história, não só da filosofia, mas das sociedades como um todo, posto que não possa avaliar o que é feito da e na filosofia ao longo do tempo sem considerar a história como ponto fundamental para essa discussão.

É importante ressaltar, o que já nos parece claro, que a mulher na sociedade está posicionada, desde muito tempo, em uma condição de inferioridade e passividade em relação aos homens. Sem generalizar, é possível, até hoje perceber fortes marcas desse fato. As marcas do paternalismo trazem consigo no cerne do seu desenvolvimento, a mulher como sendo uma construção, um modelo que só É em relação a um EU absoluto, que é o homem, o macho..., representado nas figuras de: Pai, irmão, avô, marido, filho, não somente, mas também na figura do patrão, do governante, do sacerdote (ou líder religioso) e etc.

Essa construção da Alteridade feminina, como SENDO, apenas, em relação ao EU - masculino, é um conceito enraizado, apesar de não estabelecido formalmente, e é defendido nas entrelinhas ou até mesmo abertamente, em muitas obras de filósofos consagrados, como Aristóteles, Maquiavel, Descartes, Hegel, Kant e etc. Sem contar com o fato de não encontrarmos, na tradição filosófica difundida, alguma filósofa. Sequer há a citação da existência das mesmas na história da filosofia antiga e medieval principalmente.

Não é possível afirmar com certeza se de fato há uma diferença essencial entre o indivíduo feminino e o masculino, no que diz respeito à ontologia ou a epistemologia. Essa diferença é mais claramente problematizada no campo da ética e da moral. Mais especificamente nesta última, já que é possível perceber, que a base que constitui a sociedade se dá no âmago da moralidade.

É fundada na moral vigente de cada época que a noção de mulher é estabelecida. É no campo da moral que o paternalismo conseguiu prevalecer por anos e mais anos sobre qualquer aspecto de diversidade nos vários níveis das relações, e até hoje, permeia as mesmas.

O individuo feminino, a pessoa feminina, o sujeito feminino, enfim, o feminino em si será sempre o outro da dupla categoria de ser humano? Será que sempre o foi? Já que nas origens, antes de qualquer construção de pensamento que se pudesse chamar de filosofia, não houve, e talvez nem fosse possível haver, uma neutralidade de tratamento de ambos os gêneros nos vários espaços? E já que a divisão de espaços e aptidões parece-me, foi o caminho mais fácil encontrado, será que pode fundamentar a exclusão das mulheres nas bases do conhecimento científico e filosófico?

De fato não é possível estabelecer uma resposta concreta a estas indagações. A criação do feminino, não enquanto característica, mas como alteridade, não se deu/dá de maneira comedida, e foi reafirmado categoricamente e sustentado em prol de uma civilização unilateral. Pode ter sido um grande equívoco, pode ter sido a alternativa mais viável, e seja o que for só se deu por sua sutileza, e porque as mulheres foram caladas, e calaram-se diante desta realidade.

Hoje, mudanças radicais estão sendo desfrutadas enquanto outras são plantadas, e apesar de ainda, no que diz respeito à temática da mulher na sociedade, o que é discutido se dá de maneira secundária, penso que esse é o caminho rumo não somente a desconstrução dessa alteridade feminina que foi forjada historicamente, mas acima de tudo, de uma neutralidade das relações nas suas diversas formas e espaços, seja socialmente, profissionalmente, politicamente, culturalmente, artisticamente, intelectualmente ou filosoficamente, e em constante diálogo com as diferenças entre as pessoas independente de gênero, sexo ou sexualidade.

Nas últimas décadas isso vem sendo modificado por causa das transformações relacionais. Cada vez mais as mulheres vêm conquistando ao longo dos tempos novos espaços, possibilitando assim o combate à discriminação de gênero nas suas formas diversas. Mas acredito que só vamos sentir a coisa toda de maneira diferente quando a alteridade feminina deixar de ser uma mera delimitação de papel social e passar a ser apenas o indicativo de um aspecto da identidade da pessoa do sexo feminino.

(Em avaliação. Sujeito a alterações)

Ediane Soares


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