segunda-feira, 4 de abril de 2011

Filósofo pela intenção, estóico por ofício, cosmopolita por excelência!

Lendo um livro, como fonte de pesquisa para um trabalho, me deparo com um dos maiores prazeres de se estudar filosofia: um pensamento genial e atemporal. Como diria um admirado filósofo contemporâneo, (que prefere ser chamado de músico), Prof. Dilmar Miranda, é quase "um gozo estético".

Trata-se do livro "O Ofício do Filósofo Estóico: O Duplo Registro do Discurso da Estoá", da Rachel Gazola (PUC-SP). Texto raro no meio acadêmico, principalmente em se tratando da área de Filosofia antiga. Claro, conciso, leve, didático e ao mesmo tempo gostoso de ler.

Mas a pérola a qual me referia (não menosprezando o texto da autora), diz respeito a algumas frases de Zenão de Cício (336 a.C. – 264 a. C.), que a autora cita em seu livro, que dizem:

"... devemos considerar todos os homens como 'démotas' e cidadãos, e que o modo de vida seja uno e a ordem una, como um rebanho que numa pastagem se nutre em conjunto, segundo uma mesma lei..."

"... é inútil a cultura geral... os tribunais, os ginásios, os santuários são inúteis... o sistema de educação é inútil"

Pérola de pensamento. Nada mais atual! Nada mais lógico, principalmente se analisarmos sob o ponto de vista da contextualização do autor e da conjuntura na qual ele vivia. 

Zenão era estrangeiro em Atenas. Um bárbaro. Chega ainda jovem à cidade grega, a polis por excelência, para estudar. Já naquela ocasião, por volta de 326 a.C, Atenas, apesar de seu rico aparato cultural e desenvolvimento comercial, passava por uma visível decadência ético-política. Além disso, ainda persistia a idéia de que os gregos eram superiores aos outros povos. Ao consultar o Oráculo sobre o que deveria se ocupar em seus estudos recebe o indicativo: "torna-te da cor dos mortos". Zenão, segundo Diógenes Laércio, interpreta como tendo a missão de conhecer a cultura grega, desde Homero.

Mais tarde funda a sua escola, que se reunia na Stoa Poikile, razão pela qual seus discípulos ficaram conhecidos como estóicos. Tratava-se de um pórtico abandonado, que guardava nas paredes pinturas matizadas, onde na época da "Tirania dos Trinta", haviam morrido mais de 1.400 atenienses (Escolhera o local por causa do oráculo? Não se sabe certamente).

Considerado pelos historiadores como tendo sido um homem de bem, dígno, Zenão e sua doutrina, também ficaram bastante conhecidos por não se importarem com o civismo grego. Ele poderia ter reivindicado a cidadania ateniense, mas ao contrário, era bastante crítico à cultura centrada em tal posicionamento. Para ele, antes de ser cidadão de qualquer lugar, seria necessário perceber-se como parte do cosmo, de maneira a aprofundar a individualidade universal, que não vê na individualidade a mesma conotação moderna de separação do individuo dos demais e do mundo, mas enfatiza a singularidade de cada um, ao mesmo tempo  em que afirma que "ser homem é anterior a ser grego, fenício ou espartano e que o essencial é ser cosmopolita, cidadão do mundo, o que significa desconsiderar os limites geopolíticos traçados pela historicidade".

O próprio Zenão fez do estoicismo um adjetivo. E mais tarde, outros segmentos da escola fundada por ele, mesmo inovando e desconstruindo alguns traços da sua doutrina, ainda um tanto influenciada pelos cínicos, demonstraram que a essência desse pensamento permanecia: é preciso saltar da Polis à Cosmopolis. O cosmopolitismo, nessas bases, vieram a influenciar, mais tardes, grandes pensadores e os variados debates  na área de Direitos Humanos.

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Segue abaixo o resumo do meu trabalho para apreciação:

O COSMOPOLITISMO ESTÓICO E OS DIREITOS HUMANOS

O fundador do estoicismo foi Zenão de Cicio (336 a.C. – 264 a. C.), que nasceu em Cítio, na ilha de Chipre, mudando-se para Atenas por volta de 312 ou 311 a. C.. Seus discípulos, formadores da escola estóica, ficaram conhecidos como estóicos por causa do lugar onde se reuniam, Stoa Poikile. Segundo a escola fundada por Zenão, para se alcançar a felicidade, que é o próprio sentido da vida, é necessário ser cosmopolita, ou seja, cidadão do mundo, o que significa ultrapassar os limites geopolíticos da existência. O conceito de cosmopolitismo nascente com os estóicos surge da necessidade de troca de experiências entre os povos, onde o individuo pertencente a um povo deveria sentir- se em casa em qualquer parte do mundo, disposto a aprender e vivenciar novas culturas, além de transmitir aspectos da cultura do seu lugar de origem, sem sofrer represaria por ser estrangeiro. O presente trabalho tem por objetivo mostrar as influências dessa escola de pensamento tão importante para a História da Filosofia nos atuais debates sobre Direitos Humanos no âmbito das relações internacionais. Um aspecto importante que será abordado neste trabalho é a atual situação dos imigrantes e a restrição ou limitação da circulação das pessoas pelo mundo.

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